Frequentemente descrita como “a corrida de pé mais difícil do mundo”, a Badwater 135 no Vale da Morte abrange 217 km, ela se inicia na Bacia de Badwater, no Vale da Morte, o ponto mais baixo da América do Norte e vai até uma elevação de 2548 m no Portal Whitney, o ponto mais alto no continente dos EUA.
São poucas as criaturas na Terra
que poderiam suportar tal provação e, mesmo assim, aproximadamente 100 pessoas
se inscrevem todos os anos para provar sua força e resistência. Parece que a
corrida de longa distância é uma área onde os humanos superam outras espécies,
mesmo que nossa habilidade de andar sobre duas pernas nos torne, em média,
metade da velocidade de outros mamíferos de tamanho semelhante. Os seres
humanos têm consistentemente superado várias espécies em distâncias que
normalmente nos deixariam exaustos em uma corrida, incluindo cães, cavalos e
chitas.
Há evidencias científicas que mostram que os humanos evoluíram para serem corredores. Em um artigo de 2007 na revista Sports Medicine, biólogos da Universidade de Utah escreveram que diversas características exclusivas dos humanos sugeriam que a corrida de resistência desempenhava um papel muito importante em nosso desenvolvimento.
Mas o que há em nossos corpos que
nos permite realizar corridas tão longas?
Uma hipótese que pode ajudar a
entender nossa habilidade em correr maratonas é corroborada por um punhado de
ossos descobertos na África Central em 2001, com cerca de 7 milhões de anos.
Quando nossos ancestrais semelhantes aos simios abandonaram as copas das
árvores para explorar o solo. A princípio, sua locomoção era ineficaz. Contudo,
ao longo de vários milhões de anos, conforme o clima se tornou mais quente e as
vastas savanas prevaleceram no cenário, os primeiros hominídeos aprimoraram a
locomoção bípede. A transição para duas pernas proporcionou-lhes maior altura
para enchergar um alto território em busca de ameaças, além de permitir que
percorressem o dobro da distância com o mesmo gasto energético.
Já um outro estudo propõe que
antes da invenção de lanças ou arcos, os primeiros caçadores adotavam uma
técnica de caça de resistência, onde seguiam um animal por horas até ele
superaquecer, assim tornando-se fácil de abater a curta distância. Um artigo de
2006 na revista Current Anthropology fornece evidências dessa prática de caça
de resistência entre caçadores-coletores contemporâneos, como os bosquímanos na
África.
Nossos corpos foram projetados
para a correr longas distâncias
O tendão de Aquiles, a faixa IT
(uma faixa espessa de tecido que desce pela parte externa da perna) e o arco do
pé funcionam como molas, eles armazenam energia elástica e devolvem-nos parte
dela à medida que avançamos. Os músculos robustos das costas evitam que a parte
superior do corpo caia para a frente e os movimentos dos braços estabilizam a
cabeça.
Nossa coluna tem o que é
conhecido como geradores de padrões centrais que criam e regulam movimentos
básicos, como caminhar ou correr, extraindo informações sensoriais de nossas
articulações e da palma dos pés para nos manter caminhando adiante. Essa forma
de automação libera o cérebro para se concentrar em tarefas que necessitam de
mais energia.
Uma das adaptações mais
importantes que diferenciam os humanos talvez estejam ligadas à nossa
habilidade de eliminar calor. Nossos corpos altos e eretos criam uma grande
área de superfície para resfriamento, e a capacidade de respirar pelo nariz e
pela boca também ajuda a eliminar o calor. Os humanos também são uma das únicas
espécies com capacidade de suar e, sem pelos grossos, nosso suor pode evaporar
facilmente da pele, resfriando-nos.
Existem também outras evidências
de que a evolução favoreceu a corrida de longas distâncias. Um estudo publicado
no The Journal of Experimental Biology em fevereiro passado mostrou que os
dedos curtos do pé humano permitiam uma corrida mais eficiente, em comparação
com animais com dedos mais longos. Aumentar o comprimento dos dedos em apenas
20% duplica o trabalho mecânico do pé. Até o fato de o dedão do pé ser reto, e
não lateral, sugere que nossos pés evoluíram para correr.
Mas se nós nascemos para correr,
por que tantos corredores sofrem lesões?
Segundo especialistas, isto está
ligado a uma série de fatores. O exercício no início da vida pode afetar o
desenvolvimento dos tendões e músculos, mas muitas pessoas só começam a correr
na idade adulta, por isso os seus corpos podem não estar tão bem desenvolvidos
para corridas de longas distância. Além disso, correr apenas em superfícies
artificiais e com calçados de alta tecnologia pode alterar a biomecânica da
corrida e consequêntemente aumentando os riscos de lesões.
Uma possivel solução seriam
treinamento mais lentos e fáceis durante um longos períodos. Além disso, correr
em uma variedade de superfícies e com tênis mais simples e com menos
amortecimento pode restaurar a forma natural de corrida.
Fonte: Só Científica.